2 de jan. de 2009

Almas e Angola

O ritual Almas e Angola se constitui no mais completo ritual umbandista da atualidade com fortes raízes africanas da região de Angola e severos preceitos influenciados pela doutrina iorubana (Kêto e Nagô), também originária da África.
Na verdade, o objetivo final de toda e qualquer religião é o desenvolvimento das faculdades mediúnicas inerentes a todo ser humano e o Almas e Angola segue este rumo. O homem, desde seu surgimento na terra, necessita de uma auto afirmação para se entender e entender a vida como um todo. Encontrar explicações para a sua existência e seu dia a dia até o seu desencarne. Os mistérios são muitos e as religiões tentam explicar um a um, cada uma a seu modo com seus dogmas e preceitos.
O ritual Almas e Angola busca estas afirmações nas lendas dos orixás africanos mesclada com a historia dos santos católicos.
Através desta mitologia o médium, agora chamado de filho de santo, procura se conhecer e chegar as suas conclusões a respeito de tudo o que o envolve e o influencia e também como ele pode influenciar no seu destino.
A metodologia ritualística do Almas e Angola se resume em fazer renascer, firmar, desenvolver e aperfeiçoar o orixá que está dentro de nós (o nosso Anjo da Guarda). Isso se faz no decorrer do desenvolvimento das faculdades mediúnicas onde o filho de santo galga os sete passos em direção ao assentamento de seu orixá em seu ori (palavra nagô que significa cabeça, chacra coronário ou coroa).
:: Os sete graus de iniciação ritualísticas ::
Batismo ou confirmação de Batismo;
Bori (dar de comida à cabeça);
Pai ou Mãe Pequena;
Babalaorixá ou Ialorixá;
Reforço de 7 anos;
Reforço de 14 anos;
Reforço de 21 anos;


ALMAS E ANGOLA EM SANTA CATARINA

O culto do ritual Almas e Angola foi trazido do Estado do Rio de Janeiro por Guilhermina Barcelos (Mãe Ida de Xangô), umbandista devota, nos anos 40, sendo reconhecida como a primeira pessoa em Santa Catarina a realizar feitura de santo em Almas e Angola. Sua iniciação nesse ritual se deu em Janeiro de 1949 na Tenda de Almas e Angola de Luiz D'Angelo, localizado na época à Rua Iguaçu n° 57, no bairro Engenho Leal, Estação de Trem, no Estado do Rio de Janeiro.
Em 1951, Mãe Ida adapta seu terreiro de Umbanda ao novo ritual e abre a Tenda Espírita São Jerônimo localizado no bairro Saco dos Limões em Florianópolis e, com a presença de seu Pai de Santo Luiz D'Angelo, inicia uma missão que até hoje espalha suas raízes pelos quatro cantos deste Estado.
Após o desencarne de Pai Luiz D'Angelo o ritual Almas e Angola no Rio de Janeiro praticamente se extinguiu, haja visto que diversas pesquisas e visitas àquele Estado não foi possível descobrir mais nenhum terreiro de Almas e Angola.
Entretanto, aqui no Estado de Santa Catarina ele desenvolveu-se de tal forma que são inúmeros os templos que praticam este ritual e, a cada dia que passa, aumenta o número de seguidores, devotos e terreiros.
E desenvolvimento significa evolução, alterações e adaptações, por isso hoje o ritual Almas e Angola sofreu modificações que se distanciam um pouco do praticado por Luiz D'Angelo. Modificações necessárias mas fundamentadas no raciocínio lógico e sempre orientadas pelas entidades espirituais dos Pais de Santo.

Muitas dessas adaptações foram realizadas por Evaldo Linhares (Pai Evaldo de Oxalá) um dos primeiros filhos de santo de Mãe Ida, que fundou a Tenda Espírita Jesus de Nazaré, localizado na Rua Gisele, bairro Bela Vista em São José e toca até hoje sua casa com dedicação e conhecimento profundo do ritual. A partir de Pai Evaldo o ritual Almas e Angola solidificou-se na região da Grande Florianópolis, tornando-se ele um de seus baluartes e incansável lutador empenhado na difusão e fortalecimento dessa seita.
Mãe Ida
Não se pode falar no Ritual de Almas e Angola sem citar aquela que foi seu verdadeiro baluarte em Santa Catarina: Guilhermina Barcelos – Mãe Ida.
Nascida em 25 de outubro de 1920, na cidade de Rio do Sul, muito cedo começou a sentir a força da espiritualidade. Aos 16 anos já sofria muito pois não entendia e não aceitava as situações inexplicáveis em que se envolvia, em decorrência de sua mediunidade extremamente aflorada.
Por muitas vezes foi levada ao Centro Kardecista de Tiadomiro, no bairro Estreito. Outras vezes foi levada para a casa da família Farias, no balneário, onde recebia passes, na tentativa, em vão, de aliviar se sofrimento.
Foi então de passou a freqüentar o terreiro de mãe Didi. Mais tarde fez parte da casa de mãe Malvina, mas foi em sua própria residência, na Vila Operária, no Saco dos Limões, em Florianópolis, que Mãe Ida atendia grande número de pessoas necessitadas de auxílio, sempre sob a orientação espiritual do Caboclo Guaraci.
Nesta época também trabalhava com a querida Vovó Hiriquita, que com suas benzeduras realizava muitas curas e com suas histórias enriquecia espiritualmente as pessoas que a procuravam.
Também neste período, Mãe Ida, dava incorporação ao Exu Marabô, a Pomba-Gira Rainha e a bejada Cosme (sua primeira bejada). Mais tarde, já em Almas e Angola, passou a trabalhar com a bejada Dalvinha.
A procura por mãe Ida e suas entidades espirituais tornava-se cada vez maior, e então com a ajuda de seus filhos de santo, construiu seu próprio terreiro, nos fundos de sua casa. A Tenda Espírita São Jerônimo.
Lá muitas pessoas tiveram a oportunidade de desenvolver sua mediunidade na Umbanda, sempre sob sua orientação.
Em 1945 mãe Ida conhece no Rio de Janeiro, mais precisamente no bairro Cordovil, na Tenda Espírita Caboclo Tuití, o Babalaorixá Luiz D’Angelo, e o ritual Almas e Angola, pelo qual ficou fascinada.
Quatro anos se passaram e durante este tempo Mãe Ida foi ao Rio de Janeiro por muitas vezes, adquirindo conhecimentos do ritual Almas e Angola.
Por orientação de vovó Hiriquita, em janeiro de 1949, Mãe Ida realiza sua primeira feitura de santo, na Tenda Espírita Fé, Esperança e Caridade, de Pai Luis D’Angelo, filho de Xangô e Iemanjá.
Durante 2 meses Mãe ida permaneceu no Rio de Janeiro. Todas as suas entidades confirmaram seus pontos, sendo que o Caboclo Guarací confirmou o ponto de seus orixás – Xangô e Iemanjá.
Pai D’Angelo, impressionado com a firmeza das entidades de Mãe Ida, resolveu coroá-la Ialorixá. Assim Guilhermina Barcelos tornou-se a primeira Ialorixá com feitura em Almas e Angola de Santa Catarina. Seus padrinhos de camarinha foram Virgilino (Cipozeiro) do ritual de Angola e a Ialorixá Lídia de Almas e Angola.
Voltando a Florianópolis, organizou sua tenda espírita para cultuar o novo ritual a qual havia sido consagrada.
Em 1951, Pai D’Angelo veio A Florianópolis e Mãe Ida então abriu as portas ao público, iniciando assim o Ritual Almas e Angola em Santa Catarina.
Mãe Ida realizou inúmeras camarinhas em seu terreiro, tendo aprontado neste ritual um grande número de filhos de santo em Almas e Angola. Seus primeiros filhos de santo foram Aldo Freitas (Cocoroca) já desencarnado e Maria de Jesus Geraldo (Bia) também desencarnada.
Através de gerações, Mãe Ida foi transmitindo seus conhecimentos e ao longo de sua vida sempre deu incentivo e encorajamento a todos que a procurava, haja visto que com seus 80 anos ainda se encontrava em atividade religiosa. Nesta época realizou, segundo ela própria, a feitura do médium mais jovem coroado por ela, Rafael de Oxossi.
Ontem, aos 84 anos Mãe Ida desencarna, deixando uma história para o mundo religioso desta terra e um exemplo para a Nação de Almas e Angola.
Sua raízes foram tão profundas que nos dias de hoje, o ritual de Almas e Angola se espalhou pelo Estado de Santa Catarina, onde existem mais de duas centenas de terreiros, abrigando centenas de filhos de santo e milhares de adeptos e simpatizantes.
Esta é a sua vida Mãe Ida e aqui estão seus filhos, netos, bisnetos e tataranetos de santo prestando esta justa homenagem, pelo que a Senhora foi e continuará sendo em nossos corações.
Que a Misericórdia de Xangô e a Benevolência de Iemanjá lhe abençoem hoje e sempre para a eternidade

O RITUAL

O ritual Almas e Angola se constitui numa seita onde se cultua os Orixás (forças da natureza que influenciam o homem e seu ambiente). A forma do culto aos Orixás está ligada à mitologia africana, mais precisamente da região de Angola, embora a nomenclatura usada nesse ritual tem muita influência da região de Iorubá (Kêto e Nagô). A própria palavra Orixá é um exemplo disso.
Segundo a mitologia, Orixá é uma força energética da natureza que influencia e comanda os caminhos do homem e do seu meio ambiente. Cada indivíduo tem o seu Orixá que o protege, orienta e, às vezes castiga, porém, este na verdade, só se manifesta na prática de incorporação (toma o filho) em situações muito especiais como durante a camarinha (feitura do santo).
O Almas e Angola nesse aspecto se assemelha ao Candomblé, quando o filho de santo é recolhido no terreiro e fica determinado tempo para as práticas de feitura de seu Orixá que é culminada com a apresentação desse Orixá ao meio umbandista na Saída de Camarinha, uma festa tradicional e muito conceituada entre os praticantes dessa religião.
Almas são espíritos desencarnados, geralmente nossos ancestrais familiares ou não, que incorporam no filho de santo para as práticas características da Umbanda, isto é, os passes, consultas, rezas, mirongas, trabalhos, descarregos, etc. Sua apresentação são de pretos-velhos (antigos escravos) que simbolizam a humildade perante o sofrimento, os caboclos (índios nativos do Brasil) que representam a luta contra os obsessores e a cura pelas plantas e os exus (espíritos de qualquer natureza) que se caracterizam pela irrascividade, alegria, descontração mas que detém o poder da magia.
Assim uma definição do ritual Almas e Angola seria pelo menos desastrosa, pois muitos são os ramos que contribuíram para a sua formação e vários são os mistérios que envolvem essa prática. Só mesmo os praticantes tem condições de avaliar a profundeza de conceituação e o fundamento do ritual Almas e Angola.

TERREIROS DE ALMA E ANGOLA

Qualquer terreiro de Umbanda que cultua o ritual Almas e Angola deverá ter certas particularidades físicas e ritualísticas. Logicamente a estrutura ritualística desses terreiros não pode ser revelada ao grande público por se tratar de um dogma religioso de grande fundamento e é proibido revela-los a leigos.Entretanto para se identificar um terreiro de Almas e Angola basta observar sua estrutura física, seu ambiente, que basicamente assim se constitui:
À entrada existe um local de proteção espiritual chamado tranqueira onde se encontra firmado o povo de esquerda para dar segurança espiritual aos trabalhos. Também à entrada existem dois recintos, separados do corpo da construção, chamados o primeiro de Cangira ou Casa de Exú onde estão os fundamentos dessas entidades, a segunda chamada de Casa das Almas, local destinado aos Pretos Velhos e os fundamentos das almas.
O terreiro, propriamente dito é um salão de tamanho variável com separações bem definidas e entendidas por todos os conhecedores do ritual. Nele há o Congá ou Gungá com os santos católicos sincretizando os orixás africanos, de cada lado existem duas peças de tamanho suficiente para uma pessoa deitar, chamadas Camarinha, onde os filhos são recolhidos para o ritual de feitura de santo, o salão de gira onde ocorre a manifestação dos orixás, o local para os Ogãs e o local para os assistentes. Anexo há a Cozinha de Santo e a Sala dos Cambones e Sambas. Também há vestiários e sanitários. Em alguns terreiros há o Quarto de Santo onde são guardados os preceitos e fundamentos do ritual.
No congá ou altar a posição dos orixás varia muito pouco de um terreiro para o outro, porém três orixás têm seu lugar definido em todos eles. Oxalá ocupa o lugar de destaque, no alto e no centro do congá. Embaixo e à direita é o local de Bejada e à esquerda fica Obaluaê. Um quarto orixá, Nanã, quando esta não é orixá dona da casa, deve ser posicionado aos pés de Oxalá. Os orixás donos da casa de santo ficam à direita e à esquerda, um pouco abaixo de Oxalá. À direita deve ficar o orixá dono do ori do zelador da casa (Pai ou Mãe de Santo). Os outros orixás são posicionados entre os orixás acima conforme a hierarquia do dono do terreiro.
No salão de gira existem sinais cabalísticos do Almas e Angola representado por uma estrela de cinco pontas circulada por dois círculos de forças, um voltilhando as pontas trazendo as forças astrais de Oxalá para o mundo que é simbolizado por um circulo menor centralizado na estrela. Ao meio uma cruz simbolizando a fé de todos os filhos em Oxalá. A estrela de cinco pontas também simboliza o homem de braços e pernas abertos, prostrado com a cabeça no chão, aos pés de Oxalá, implorando misericórdia. As cores variam conforme o orixá mandante na casa.
Nos quatro cantos existem cruzes brancas simbolizando os quatro cantos do mundo ou do universo representando os orixás guardiões da casa de santo.